Amor(a)

Perto da minha casa tem um pé de amorinha. Sabe aquelas que você come e sua boca e dedos ficam tingidos de vermelho? A árvore está perto de onde passa o trem, nada a cerca, nada impede que alguém se aproxime. Cada vez que passo por lá, tem uma pessoa diferente colhendo uma ou duas frutinhas, esticando-se sobre as pernas para alcançar a mais madura, numa atitude tão inocente que faz lembrar o som do riso despreocupado de uma criança.

Essa cena me pareceu tão encantadora que a minha vontade era fotografar, para eternizar aquele momento. 

E então, estando satisfeitas e sujas de vermelho, as pessoas simplesmente sorriam, davam as costas a árvore e seguiam seus caminhos.

Assim deveriam ser todas as relações humanas. Deveríamos entrar na vida dos outros, pegar só o que for oferecido, ficar um tempo, sorrir e ir embora, deixando ambas as partes satisfeitas, sem deixar ninguém machucado, sem causar dano algum, sem vandalizar. Deveríamos um dia ou outro fazer o papel da árvore. Deixar que se aproximem e oferecer algo pra quem o faz, ficar feliz ao ver o outro satisfeito, e quando ele decidir ir embora, dizer tchau e torcer para que algum dia haja reencontro.

Sem dor, sem mágoa, sem raiva, sem traumas. A árvore oferece amora, nós oferecemos amor.