Dois sentidos

Na manhã do dia nove de julho de um ano qualquer, esperei por você sentada na varanda de casa. Enrolei um cacho do meu cabelo castanho no dedo, imaginando que você logo passaria, varrendo a calçada com seus passos lentos e meio atrapalhados. Imaginei que de uma vez por todas, você me olharia com olhos de homem que sabe o que está fazendo, e deixaria de lado por um momento aquela expressão de menino inocente que precisa de colo. 

Olhando o caminho por onde você sempre vinha, relembrei de alguns momentos em que estivemos juntos. Se ainda restavam dúvidas de que eu era a escolhida, elas caiam por terra no mesmo instante em que me lembrava de quando, sem querer, ficamos nos encarando por longos dois minutos, até você me perguntar o que acontecera. Depois disso, de olhos fechados, ouvidos atentos e coração acelerado, continuei a recordar pequenos fatos, uns com pouca importância, outros sem nenhuma... Até que um ruído chamou minha atenção. Lentamente, abri meus olhos e te vi caminhando pela calçada em péssimas condições. Você olhava pro chão, e eu, cruzei os dedos, esperando que você tivesse vindo me dizer tudo o que eu queria ouvir. 

Mas quando você chegou, logo me desapontei. Lá estava o menino que precisa de colo. Entediado, você foi me dizendo a que veio. Veio se despedir. Você estava indo embora. Pra onde? Porque? Eu quis fazer milhões de perguntas, mas um letreiro gigantesco escrito "você não é a escolhida" em letras garrafais, vermelhas e berrantes, começou a piscar incessantemente em frente aos meus olhos. Não sei porque a gente chega a conclusões como esta quando somos pegos de surpresa, mas o fato é que eu não escutei mais nenhuma palavra do que você me disse, pois algo diferente em seus olhos fez com que eu nada mais pudesse notar. Só o castanho do seu olho e o que ele me dizia. Sim, você ainda era o menino inocente que precisa de colo e você sempre seria. No entanto, não era no meu colo que a sua cabeça queria repousar.