Sexta à noite

João saía do trabalho exatamente como no dia anterior, e no outro, e no outro, e no outro. A diferença é que chovia. Ia ele, andando pelas ruas em processo de alagamento, de cabeça baixa, os fones tocando uma música lenta, meio depressiva. Se João fosse sinestésico, veria a cor cinza e sentiria gosto de fel. Ele caminhava lentamente como se não tivesse destino, mas ele tinha. Estava indo encontrar uma amiga, que lhe telefonara mais cedo pedindo pra que ele fosse lhe ver o mais rápido possível. A voz dela ao telefone parecera estranhamente animada. Quando João lembrou-se disso, apressou o passo, preocupado. Pouco tempo depois, ele estava apertando com insistência e a campainha da casa dela. 

Ela o recebeu com um sorriso enorme, de orelha a orelha, que parecia irradiar algum tipo de luz. Ele encarou-a, sério, preocupado, apreensivo. Franziu a sobrancelha, e sem ter mais o que fazer, abraçou sua amiga por aproximadamente 9 minutos.

- O que foi? - perguntou ele, findo os nove minutos.

- Ai! - ela riu, nervosa - Estou tão feliz! Tão tão feliz! Me sinto nas nuvens, acho que se eu pular da sacada aqui de casa eu poderia flutuar, voar, não sei.

Ele a encarou fazendo uma careta de desgosto, enquanto ela continuava a sorrir sem parar.

- Ah, meu bem - disse João, abraçando-a novamente - Não se preocupe com isso, certo? Todo mundo tem dias bons de vez enquando.